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SERÁ QUE CONSIGO IR MORAR EM PORTUGAL?


Esta é uma das perguntas mais recorrentes, que me são feitas por brasileiros, de diferentes estados, níveis sociais e económicos, idades e estágios de vida. Para a frustração da grande maioria, não há resposta pronta que tenha alguma precisão e valia. Quando leio recomendações de especialistas, respostas prontas para esta pergunta, num reducionismo absoluto, fico perplexo. De mim, sempre ouvem o tradicional depends on.

Para uma resposta que tenha um baixo nível de risco, deve ser levado em consideração um conjunto alargado de itens – uma miríade de áreas de conhecimento – que, obviamente, varia entre famílias ou pessoas. O que vale para um, quase nunca será válido para outro. O que pode contar neste momento é a soma de experiências individuais vividas ao longo dos últimos anos. Mas nunca generalizando respostas.

Listarei aqui diversos procedimentos que deverão ser realizados antes que qualquer decisão de emigração seja tomada: a decisão de avançar ou de não levar o sonho adiante. É importante que saibamos, com clareza, porque vamos ou não emigrar para Portugal. Saber que não possuía todas as condições de ir a um dado momento, poupará arrependimentos, frustrações e muito dinheiro.

Esta etapa é longa, não podemos ter pressa. Os assuntos vão amadurecendo. A fruta deve amadurecer na árvore para guardar os seus sabores. O que é fundamental, é que seja atacada de frente, sem interrupções. Tem de ser quase um assunto diário da família, para que não haja regressos ao início do processo. Desta forma nunca avançará. A participação tem de ser de todos, porque será um projeto de todos.

Em linhas gerais há que se investigar os fatores internos e externos que afetam ou condicionam esta decisão. Um mundo de pôr quês.

Vamos começar pelos fatores internos. Para tudo em nossa vida, o autoconhecimento é essencial. E na questão da emigração mais ainda. Temos que sempre levar em conta que estaremos num ambiente que desconhecemos, por mais que tenhamos estudado à distância e conversado com pessoas. E neste capítulo, conhecer a nossa capacidade de socialização, de tolerância a um certo nível de risco, flexibilidade e adaptabilidade, resiliência, diante do novo e do diferente das nossas origens, é um bom começo. Tudo isto vai ser somado à nossa capacidade de observar e apreender os códigos comportamentais do país para o qual escolhemos emigrar. Mas tem mais. Resiliência, capacidade de conviver com as diversas saudades e com os erros; de conseguir penetrar na sociedade para não ter que viver nos guetos étnicos. Viver no Brasil, em Portugal. Há milhares vivendo assim. Acham que vivem em Portugal, mas estão longe disso. O essencial na emigração é a integração com as pessoas e cultura locais.

Não esqueça, porém, de que você renunciará a algumas coisas que abandonará. Família, amigos, seu estilo de vida e hábitos, sua casa, seus cheiros, gostos e programas que poderão não mais estar presentes em sua vida, nas terras do além-mar. Os amigos do trabalho, a igreja dos domingos, e o churrasco com os amigos da escola ou faculdade. E aquela peladinha dos finais de semana ou das quintas-feiras à noite. Dos filhos, se já adolescentes, ficam para trás os amigos, as namoradinhas e o jeito deles viverem. Eles precisam, mais do que todos, participar de todo o processo.

Lembro também que é necessário se saber o caminho legal da obtenção de visto, que demanda tempo, muita documentação e alguma paciência para lidar com os Consulados, sempre assoberbados com as demandas constantes dos candidatos a emigrantes, e dos residentes portugueses no Brasil.

Um capítulo à parte é o lado financeiro. O que abandona e o que leva como reserva para os primeiros 6 meses de vida em Portugal, para não haver tanta pressão para arranjar trabalho, ou para investir em algum negócio. Há despesas com a saída do Brasil, com o transporte. As despesas de chegada também.

E aí começam os fatores externos que precisam ser pesados e exaustivamente analisados.

Olhando para eles, saltam aos meus olhos, de imediato, a escolha da cidade, bairro e tipologia do imóvel no qual viverá. Esta vai impactar diretamente na maior despesa de uma família em Portugal: o aluguel, aqui chamado arrendamento. É bom já se se acostumando. A decisão de trabalhar x empreender. O padrão de vida que se deseja, ou dito de outra forma, o sacrifício que está pronto a assumir com uma vida franciscana, recomendada a quem se lança numa empreitada desta envergadura nos primeiros meses. Ter ou não um automóvel?

O que não recomendo que seja feito?

Um projeto dessa envergadura deve começar centrado em informações corretas e bem fundamentadas. Vejo muitas famílias se apoiarem em opiniões de terceiros que qualificam bem ou mal Portugal. Opinam ou respondem a questões sem sentar-se na cadeira de quem pergunta. Os grupos do Facebook e os canais do Youtube estão cheio de informações. Algumas boas, outras equivocadas e incoerentes. O difícil é perceber quais são corretas ou não. Ou porque tiveram uma má experiência ou souberam de alguém que se enrascou. O que nunca conseguem perceber é que cada um é cada um… Esse talvez seja o maior inimigo de quem deseja emigrar. Não sabemos o porquê de cada informação negativa ou positiva que estas pessoas passam. Falta, a eles todos, empatia.

Vou dar aqui alguns exemplos:

(1) Já vi algumas vezes pessoas bradarem que os portugueses não gostam dos brasileiros. Quais portugueses, pois eles são diversos em função da região, faixa de renda, cultura e profissão? E quais brasileiros eles não gostam? Será que eles não gostam daqueles que querem trazer os hábitos brasileiros para cá, por exemplo?

(2) O custo de vida é muito elevado. Falam isso sem mostrar uma tabela comparativa que relacione despesa contra receita em euros.

(3) Falam que tudo é caro, sem considerar que podemos educar nossos filhos quase sem nenhum gasto. Que os seguros saúde são baratos, que em alguns casos não precisamos ter automóvel.

(4) Falam que os aluguéis são altos, mas não lembram que o inquilino não paga condomínio e imposto. E que há alternativas de estilo de vida, que impactam bastante na redução do valor a pagar de aluguel.

Com a explosão da internet a coisa se agravou. Grupos são formados e pessoas, por má-fé ou desconhecimento, escrevem barbaridades, induzindo as pessoas a erros grosseiros no processo. Tentam esclarecer pelos seus olhos e nunca pelos olhos de quem pergunta.

O processo de emigração de uma família é único. Ele até pode se aproveitar da experiência de outros, mas sempre considerando que os outros têm expectativas e características familiares diversas. O projeto de emigração é como a estrutura de uma casa, onde cada tijolo, coluna ou viga são informações que não podem falhar pois de outra forma a casa corre o risco de ruir.

Nossa satisfação vem do cumprimento de nossas expectativas. E estas variam de entre pessoas e famílias.

RL

Setúbal, 15 de outubro de 2023



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